segunda-feira, 27 de outubro de 2008

Caco Barcellos no Diálogos Universitários

No último dia 22, no salão nobre da reitoria da UFBA ocorreu mais uma sessão do evento Diálogos Universitários. O palestrante foi o jornalista da rede Globo de televisão, correspondente de guerra e repórter investigativo Caco Barcellos. Ele é também autor de sucessos como Rota 66, livro-reportagem, e Abusado, romance sobre o tráfico. Além das obras de sucesso Barcellos também escreveu Nicarágua: revolução das crianças, livro que trata do movimento Sandinista. Compareceram, como convidadas, Malu Fontes e Heloísa Gerbasi, ambas professoras da Faculdade de Comunicação, da Universidade Federal da Bahia.
Barcellos destacou inicialmente a violência armada no Brasil, assunto sobre o qual fala com propriedade – vide o livro Rota 66. Em seguida falou sobre o caso Eloá e lembrou a morte da menina Isabela, mas centrou sua exposição em demonstrar, através de sua experiência jornalística, quem é o matador brasileiro. No Brasil, o crime e a violência urbana matam segundo a organização Human Rights Watch cerca de 50 mil pessoas por ano. Esses números são comparáveis à quantidade de vítimas, civis e militares, de ambos os lados do combate, da Guerra do Iraque.
Devido a tanta violência, o Brasil ocupa a posição de quarto país mais violento do mundo, segundo afirmou o jornalista. E o principal assassino não é o bandido de rua, como se pensa ingenuamente, mas sim a própria polícia. “No Brasil o Estado é um grande criador de violência”, disse Barcellos. Ele relatou sua experiência de sete anos de investigação dos crimes da corporação da ROTA de São Paulo (uma espécie de pai do BOPE, segundo o mesmo). Durante esses anos de investigação o jornalista conseguiu, com a ajuda de um engraxate catalogar quatro mil e duzentos nomes das cerca de 12 mil vítimas da Rota desde sua fundação em 1970. Como os documentos eram quase sempre queimados pelos policiais, a ajuda do engraxate foi imprescindível. O rapaz chamado Sidney costumava ficar de plantão no Instituto Médico Legal de São Paulo. Quando as famílias chegavam para reconhecer os corpos dos rapazes assassinados, especialmente aqueles com concentração de tiros no peito e nuca, Sidney colhia com os parentes as informações que podia a respeito dos mortos. Das quatro mil vítimas identificadas, somente 1500 eram realmente bandidos. Só que desses mil e quinhentos apenas 1% já havia matado alguém, revelou Barcellos. Ou seja, praticamente todos os nomes listados pelo jornalista investigativo eram de pessoas inocentes, de usuários ou traficantes de drogas e não de bandidos assassinos. “Era costume da polícia assassinar quem estava com um cigarro de maconha” observou.
O aspecto mais incômodo e revelador desses altíssimos índices de violência é que a população, em grande parte, aprova as torturas do BOPE, “considera o capitão Nascimento como herói” ou simplesmente assume uma postura passiva que o palestrante considera também como uma atitude política.
O jornalista criticou a imprensa, da qual ele mesmo faz parte, dizendo: “A imprensa nem sequer divulga o nome das pessoas que são mortas pela polícia no Rio de Janeiro. Desafio vocês a listar o nome de uma vítima. A gente só dá o nome quando se mata por engano um bacana da classe média. Aí a imprensa grita que os bacanas não podem morrer”.
A segunda parte do evento que seria destinada às perguntas e que faz jus ao nome “Diálogos Universitários” foi bastante prejudicada pelo atraso inicial do jornalista (que atrasou mais de uma hora devido a problemas com o vôo). Infelizmente praticamente metade do auditório não pôde ficar até o final, pois grande parte dos ônibus urbanos só circula até as dez e meia da noite.
Após o término da palestra saiu de cena Caco Barcellos e entrou o jornalista celebridade. Num dos raros momentos em que não estava com um sorriso esculpido no rosto cheio de olheiras tirando fotos com os fãs, foi indagado sobre a legalização das drogas, como a maconha e mostrou-se cauteloso. Respondeu não ter uma opinião consolidada sobre a legalização. Foi tão prudente, que se pode dizer que estava “em cima do muro”. Disse ser preciso estudar muito para se posicionar sobre certas coisas. No entanto, aos poucos foi se revelando favorável à causa. Adiantou que é a favor, antes de tudo, da liberdade de escolha. “Se você comparar o prejuízo de um cigarro de maconha ou de uma garrafa de cachaça para um chefe de família pode concluir que a garrafa é sem dúvida muito prejudicial”, afirmou Barcellos. Perguntei a ele se sua posição era simpática, porém cautelosa, no que ele voltou atrás e respondeu que não era simpático, reafirmando a necessidade de estudar muito e pesquisar ante de emitir uma opinião.

Cabe observar que o evento foi produzido pela Souza Cruz, líder absoluta do mercado brasileiro de cigarros. Simoni Veltri, gerente de responsabilidade social da empresa, ao ser inquirida sobre a culpabilidade da Souza Cruz nas mortes ligadas ao tabagismo, disse que a empresa apóia sobretudo a liberdade de escolha de adultos conscientes. No entanto, ela parece não ter se dado conta de que grande parte dos universitários é formada por jovens adolescentes, muitos com idade situada entre 16 e 18 anos.


Julien Karl




3 comentários:

Anônimo disse...

vale lembrar que o evento era pra maiores de idade...
logo a crítica à faixa etária fica meio invalidada...

Anônimo disse...

O público universitário é formado por estudantes entre 16 e 18 na sua maioria? Sério? O índice de pessoas que passam de primeira no vestibular é tão alto assim?

Anônimo disse...

O fato do evento só ser para maiores de 18 anos já demonstra a preocupação da própria Souza Cruz. Acho meio hipócrita criticarmos uma empresa que faz um evento tão bacana como esse. Velho, fuma quem quer. Putz! Tanto que tem "coisas" que "ninguém vende" oficialmente e mesmo assim uma galera fuma. Acho que a crítica foi um tanto quanto hipócrita.